A liberdade global na Internet diminuiu pelo 12º ano consecutivo, com os direitos humanos em ambiente online a deteriorarem-se em 28 países e com os Governos a aumentar a repressão em espaços virtuais, afirmou esta terça-feira a organização vigilante Freedom House. Em Angola, com excepção da liberdade para estar de acordo com o MPLA, todas as outras apenas aguardam a passagem da certidão de… óbito.
No relatório anual, denominado “Liberdade na Rede 2022: Contrariando uma revisão autoritária da Internet”, a organização sem fins lucrativos com sede em Washington indicou que as quedas mais acentuadas foram documentadas na Rússia, Mianmar, Sudão e Líbia, mas a China continua a ser, pelo oitavo ano seguido, o país com o ambiente online mais repressivo do mundo.
“Em pelo menos 53 países, os utilizadores enfrentaram repercussões legais por se expressarem online, muitas vezes levando a penas de prisão draconianas”, lamentou a organização. O documento resulta de uma análise feita entre Junho de 2021 e Maio de 2022 e analisa a liberdade na Internet em 70 países, representando 89% dos utilizadores de Internet do mundo.
“Um número recorde de Governos nacionais bloqueou sites com conteúdo político, social ou religioso não violento, minando os direitos de liberdade de expressão e acesso à informação. A maioria desses bloqueios visava fontes localizadas fora do país. Novas leis nacionais representam uma ameaça adicional ao livre fluxo de informações ao centralizarem a infra-estrutura técnica e ao aplicar regulamentações a plataformas de redes sociais e dados de utilizadores”, diz o documento.
A Freedom House estima que dos mais de 4,5 mil milhões de pessoas que têm acesso à Internet no mundo, 76% vivem em países onde indivíduos foram detidos ou presos por publicarem conteúdo sobre questões políticas, sociais ou religiosas e 64% residem em Estados onde pessoas foram atacadas ou assassinas pelas suas actividades online desde Junho de 2021.
Este relatório identifica três causas principais de fragmentação que contribuíram para diminuir o respeito pelos direitos humanos online: restrições ao fluxo de notícias e informações, controlo estatal centralizado sobre a infra-estrutura da Internet e barreiras às transferências internacionais de dados de utilizadores. Um número crescente de utilizadores só tem acesso a um espaço online que reflecte as visões do seu Governo e os seus interesses.
Contudo, apesar do cenário negativo, um número recorde de 26 países tiveram melhorias na liberdade na Internet. Duas das maiores melhorias ocorreram na Gâmbia e no Zimbabué. A Islândia foi, mais uma vez, o país com melhor desempenho. Nos Estados Unidos, a liberdade na Internet melhorou ligeiramente pela primeira vez em seis anos.
A queda mais acentuada na liberdade na Internet ocorreu na Rússia, quando o Kremlin intensificou os seus esforços “para sufocar a oposição doméstica e amordaçar a imprensa independente após a sua invasão ilegal e não provocada da Ucrânia”, apontou a organização.
Poucas semanas após o início do conflito, a 24 de Fevereiro, o Kremlin bloqueou as redes sociais Facebook, Instagram e Twitter, privando os russos de acesso a informações confiáveis sobre a guerra e limitando a sua capacidade de se conectar com utilizadores de outros países. O Governo de Vladimir Putin também bloqueou mais de cinco mil sites, obrigou os meios de comunicação a referirem-se à invasão como uma “operação militar especial” e introduziu uma lei que prescreve até 15 anos de prisão para quem divulgar “informações falsas” sobre o conflito.
“As crescentes restrições do regime, tanto antes quanto depois do lançamento da invasão, aumentaram significativamente os riscos associados ao activismo online e aceleraram o encerramento ou exílio dos meios de comunicação independentes restantes do país”, aponta o relatório.
As acções dos militares russos na Ucrânia também minaram a liberdade de Internet do país vizinho. Na cidade de Kherson, no sul ucraniano, as tropas russas forçaram os provedores de serviços a redireccionar o tráfego da Internet pelas redes russas durante a Primavera e o Verão de 2022, deixando os cidadãos ucranianos sem acesso às principais redes sociais e a uma infinidade de sites de notícias ucranianos e internacionais, denunciou a organização.
As empresas tecnológicas Google, Twitter e Meta limitaram a capacidade de os meios de comunicação estatais russos lucrarem com conteúdos nas suas plataformas e lançaram novos recursos de segurança para reduzir os riscos online, como a possibilidade de aceder a plataformas de forma segura e anónima.
Já o Governo e o povo ucranianos “mostraram uma resiliência surpreendente durante a invasão”, com funcionários do executivo e empresas de telecomunicações “a trabalharem juntos para reparar a infra-estrutura da Internet e garantir o acesso a recursos e informações online, que podem salvar vidas no meio de um conflito armado”.
A China tem o pior ambiente do mundo para a liberdade na Internet pelo oitavo ano consecutivo. “A censura intensificou-se durante os Jogos Olímpicos de Pequim 2022 e depois de a tenista Peng Shuai acusar um alto funcionário do Partido Comunista Chinês (PCC) de agressão sexual. O Governo continuou a reforçar o seu controlo sobre o crescente sector de tecnologia do país, incluindo de novas regras que exigem que as plataformas usem os seus sistemas algorítmicos para promover a ideologia do PCC”, disse a Freedom House.
Também o conteúdo relacionado com a pandemia de Covid-19 permaneceu fortemente censurado. Além disso, jornalistas, activistas de direitos humanos, membros de grupos religiosos e minorias étnicas e civis foram detidos por compartilharem conteúdo virtual, com alguns a enfrentar duras penas de prisão.
Segundo a Freedom House, funcionários do executivo chinês instituíram novas políticas para aumentar o seu controlo sobre as empresas de tecnologia do país. O principal regulador da Internet emitiu orientações exigindo que as plataformas alinhem os seus sistemas de moderação e recomendação de conteúdo com o “Pensamento Xi Jinping” – a ideologia oficial do actual líder do PCC.
A ligeira melhoria registada no Brasil foi reforçada pela falta de ataques técnicos contra meios de comunicação e organizações de direitos humanos, observados nos anos anteriores. A Freedom House atribui esta protecção dos direitos dos utilizadores a medidas como a “decisão de consagrar a protecção de dados pessoais na Constituição” e a “remoção de algumas disposições problemáticas durante a discussão legislativa sobre um projecto de lei de fake news”.
Contudo, segundo o relatório, a saúde da esfera online do Brasil foi corroída por campanhas de desinformação levadas a cabo por Jair Bolsonaro e os seus aliados, antes das eleições presidenciais deste mês.
Além disso, processos criminais de difamação continuam a ser movidos contra jornalistas pelas suas reportagens online no Brasil; e ataques físicos – por vezes fatais – por discursos em plataformas virtuais ainda representam uma ameaça para aqueles que cobrem questões sensíveis nesse universo, segundo o documento.
Redes sociais, aplicações de comunicação e plataformas de partilha de vídeos são, na sua maioria, de acesso livre e amplamente utilizados no Brasil. No entanto, em Março último, o juiz do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, ordenou a suspensão do Telegram no país sob a alegação de que a aplicação de mensagens não havia cooperado com as autoridades na luta contra a desinformação.
“O conteúdo manipulado é comum no ambiente online brasileiro, com notável proliferação de desinformação durante as campanhas eleitorais de 2018 e 2022. O problema aprofundou-se durante a pandemia de Covid-19, quando Bolsonaro e os seus aliados divulgaram desinformação prejudicial”, aponta o relatório.
A organização sem fins lucrativos indicou que o “poderoso partido no poder há 47 anos em Angola”, o MPLA, mantém o controlo efectivo dos órgãos reguladores, com o Ministério das Telecomunicações a ser responsável pela supervisão do sector das tecnologias da informação e comunicação do país.
“Embora o Governo não bloqueie ou censure o conteúdo online, a violência contra manifestantes e jornalistas recentemente contribuiu para a autocensura, restabelecendo um ambiente de medo que antes limitava a discussão pública sobre questões de governança”, diz-se no relatório.
Os membros do MPLA no poder desde 1975, segundo a organização, possuem e controlam rigidamente a maioria dos meios de comunicação do país, incluindo aqueles que são os mais amplamente divulgados e acedidos, que transmitem, em grande parte, conteúdo pró-Governo. “O controlo indirecto do Governo angolano da infra-estrutura de telecomunicações através da estatal Angola Telecom pode permitir que o executivo controle parcialmente a conectividade à Internet, se desejado”, frisa-se.
Apesar do histórico de censura na imprensa impressa e televisiva, segundo o relatório não se registou, entre Junho de 2021 e Maio de 2022, nenhum bloqueio ou filtro do Governo a conteúdo online em Angola. No relatório indica-se ainda que a infra-estrutura deficitária do país continua a dificultar a capacidade dos utilizadores de aceder à Internet de forma consistente e sem interrupções.
Em Julho de 2020, o então ministro das Telecomunicações Tecnologias de Informação e Comunicação Social, Manuel Homem, defendeu a promoção do acesso à Internet em todos os estratos sociais e em todo o país. Embora dê jeito haver electricidade, crê-se que o Governo a vá tornar “potável” através de ligação a candeeiros a petróleo ou a velas de cera…
Por todos os cantos e esquinas do país multiplicaram-se as manifestações de júbilo e elogios à tese de Manuel Homem. A população dos Gambos, por exemplo, e daquelas localidades do Cuando Cubango, onde morreram crianças devido à fome, receberam a notícia com muita alegria. Já foram comprar computadores para os filhos e velas para fornecer energia para os computadores poderem funcionar.
Alguns pais, pouco informados sobra e ciclópica capacidade do governo, perguntam se as crianças, para terem acesso a electricidade, irão ligar os computadores no tronco ou nos ramos das árvores. Esquecem-se, lamentavelmente, que a os computadores podem funcionar ligados a candeeiros ou a velas de cera.
Manuel Homem, que falava à imprensa no termo de uma visita de constatação ao Instituto Nacional de Fomento da Sociedade de Informação (INFOSI), considerou que a expansão do sinal da Internet deve permitir e facilitar o acesso a todos. “Temos de continuar a trabalhar na promoção do acesso à Internet em todos os estratos sociais por via dos programas de massificação e inclusão digital em curso um pouco por todo o país”, frisou o então ministro sem que alguém lhe lembrasse que não fica bem falar de coisas como electricidade (mesmo que na versão “potável”) a um povo que tem 20 milhões de pobres. Isto se é que esses pobres são gente, se é que são… angolanos.
Com a implementação dos Programas e Inclusão Digitais, o Ministério das Telecomunicações Tecnologias de Informação e Comunicação Social tem vindo a desenvolver o Projecto “Angola Online”, que na altura já permitira montar 111 pontos públicos de acesso à Internet, em todo o território nacional.
Acresce que, com esse acesso à Internet, os nossos pobres podem mostrar ao mundo que são dos melhores na disciplina basilar implementada pelo MPLA há 47 anos e que, por isso, constitui o seu ADN: Aprender a viver sem comer. É claro que o resultado não é 100 por cento positivo. Isto porque muitos quando estão quase, quase mesmo, a saber viver sem comer… morrem.
João Lourenço pediu/exigiu no dia 29 de Março de 2019 que fossem tomadas medidas contra dirigentes, governantes ou deputados que tenham um comportamento reprovável nas redes sociais. Uau! O Presidente abria fogo em várias direcções, mostrando que a melhor defesa é o ataque… mesmo que seja do tipo batalha do Cuíto Cuanavale.
João Lourenço, que discursava na VII sessão do Comité Central do MPLA, referia-se “a pronunciamentos e outros comportamentos públicos reprováveis nas redes sociais e não só, por parte de militantes, dirigentes e deputados”, que, considerou, “em nada dignificam” o partido.
Isto, é claro, para além de não respeitarem as (suas) ordens superiores que, como se sabe, defendem a liberdade de opinião desde que esta, obviamente, seja igual à do chefe.
Para João Lourenço, o partido não pode continuar “impávido e sereno” perante tais pronunciamentos, apelando aos órgãos do MPLA que, no quadro dos estatutos, tomem uma posição. Ou seja, todos devem manifestar as ideias e os pensamentos veiculados pelo Departamento de Informação (e Propaganda) do Comité Central do MPLA.
O chefe de Estado e presidente da maior seita política de Angola frisou que foi lançada e promovida uma campanha a nível nacional de recuperação dos valores morais e cívicos da sociedade, por ter sido reconhecido uma acentuada queda desses ideais nos últimos anos. Daí a necessidade de blindar a “Educação Patriótica do MPLA” como condição ”sine qua non” para se ser angolano de… primeira.
De acordo com João Lourenço, o partido deve liderar esta campanha pela força do exemplo dos seus militantes, sejam eles mentirosos compulsivos quando falam da suposta vitória na batalha do Cuíto Cuanavale ou criminosos cobardes quando abordam a questão dos massacres do 27 de Maio de 1977.
O também chefe de Estado realçou que o país está mais aberto, e esta mudança de comportamento reflecte-se também no seio do partido, uma vez que os “militantes são, em primeiro lugar, cidadãos que integram esta mesma sociedade angolana”.
E que tal exonerar as redes sociais?
O Governo (do MPLA) e os cidadãos (do MPLA) devem formar um grande pacto de convivência saudável no domínio das redes sociais, defendeu o então ministro da Comunicação Social, João Melo. “É preciso formas consistentes de lutarmos por objectivos consistentes”, destacou o governante, numa mensagem alusiva ao Dia das Redes Sociais.
Na mensagem, João Melo afirmou que as redes sociais são actualmente uma vida paralela das pessoas, na medida em que mais do que uma forma de socialização globalizada elas “são um parâmetro e um termómetro para tomada de decisões”.
“Não há dúvida de que as redes sociais devolveram nas mais variadas sociedades o exercício da cidadania, o que deve ser celebrado, dada a importância do debate para o exercício pleno da democracia”, escreveu o ex-ministro da Comunicação Social.
João Melo reconheceu, no entanto, que “nem tudo pode ser considerado positivo”, pois a rede social que informa e aproxima as pessoas é a mesma que amplia a disseminação de mentiras, boatos, pornografia e faz a apologia ao crime.
Na sua mensagem, o governante conclui que as redes sociais devem ser entendidas como um convite ao diálogo, sem fronteiras, com grupos pequenos ou para multidões.
Nesta nova realidade, sublinhou João Melo, somente a comunicação de via dupla terá êxito. Por isso, a maior lição das redes sociais é, antes de falar, “aprender a escutar”, ouvir o outro, conhecer as tendências e ter o discernimento do certo e do errado para a tomada de decisão.
Embora com uma maquilhagem diferente, a intenção deste, como dos anteriores, governos do MPLA é controlar as redes sociais, onde diz ser “questionado” e “ridicularizado”.
João Melo vestia na altura a pele de cordeiro (que até lhe ficava muito bem) mas, na verdade, o que ele e o governo que integrou pretendem é o mesmo que é defendido, embora de forma mais boçal, pelo general Bento dos Santos Kangamba, para quem a internet não mais deve ser usada para criticar as autoridades do país.
“Continuo a vos dizer que a internet veio, é aquilo que o presidente disse, a internet veio para as pessoas estudar, para investigar, melhorar o comportamento do seu estudo e aprender. Não é para entrar na vida das pessoas,” afirmou Kangamba.
O MPLA (que continua a entender que Angola é do MPA e o MPLA é Angola) sustenta agora, nomeadamente com a ajuda da sua sucursal para controlo dos jornalistas (ERCA) que o partido e o executivo (são uma e a mesma coisa) têm vindo a ser “questionados” e “ridicularizados” nas redes sociais, reavivando a controversa temática do controlo das redes sociais pelo poder.
Folha 8 com Agências